DECRETO 11.453/23: AS NOVAS REGRAS PARA PROJETOS INCENTIVADOS DA LEI FEDERAL DE INCENTIVO À CULTURA (LEI ROUANET)

Este artigo apresenta as principais novidades do Decreto 11.453/23 para projetos incentivados via Lei Federal de Incentivo à Cultura.

Neste momento, não estão indicadas aqui as regras aplicáveis a outros mecanismos de fomento, como a Lei Paulo Gustavo e a Lei Aldir Blanc, que serão tratadas posteriormente em materiais específicos.

É importante lembrar que a Lei 8.313/91 (Lei Rouanet) não sofreu modificações. Questões que não são tratadas no Decreto 11.453/23, mas que continuam presentes na Lei 8.313/91, não foram alteradas e continuam em vigor.

Um exemplo é a possibilidade de um patrocinador ou doador destinar recursos a uma instituição cultural sem fins lucrativos criada por ele próprio. Apesar de esse assunto não ser tratado pelo novo Decreto, o artigo 27, §2º da Lei 8.313/91 ainda prevê expressamente essa possibilidade.

É importante lembrar também que, em breve, haverá nova Instrução Normativa complementando as regras do Decreto 11.453/23, inclusive detalhando questões que não foram tratadas neste momento nessa regulamentação.

Seguem abaixo as principais regras.

Patrocinador deve seguir as regras do Ministério para editais

Caso realiza editais de seleção de projetos, o incentivador deve observar as orientações do Ministério da Cultura.

Decreto 11.453/23

Art. 47. Para fins do disposto neste Capítulo, considera-se: (…)

V – processo público de seleção de projetos certame de seleção de projetos realizado por incentivador pessoa jurídica, com vistas à definição de investimentos como incentivo fiscal, nos termos do disposto na Lei nº 8.313, de 1991; e (…)

Art. 48. O Ministério da Cultura poderá selecionar, mediante chamamento público, as ações culturais a serem financiadas pelo mecanismo de incentivo fiscal. (…)

§ 2º A realização de processo público de seleção de projetos, via edital lançado por incentivador pessoa jurídica, seguirá orientações do Ministério da Cultura, com vistas à adesão das ações propostas às políticas culturais.

Ações afirmativas e descentralização

O Decreto 11.453/23 prevê ações afirmativas e medidas para promover a descentralização e regionalização do investimento cultural, usando mecanismos como cotas, editais específicos e critérios de pontuação diferenciados.

Decreto 11.453/23

Art. 50. O mecanismo de incentivo fiscal conterá medidas de democratização, descentralização e regionalização do investimento cultural, com ações afirmativas e de acessibilidade que estimulem a ampliação do investimento nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e em projetos de impacto social relevante.

Parágrafo único. Os parâmetros para a adoção das medidas de que trata o caput serão estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Cultura, considerados:

I – o perfil do público a que a ação cultural é direcionada, os recortes de vulnerabilidade social e as especificidades territoriais;

II – o objeto da ação cultural que aborde linguagens, expressões, manifestações e temáticas de grupos historicamente vulnerabilizados socialmente; e

III – mecanismos de estímulo à participação e ao protagonismo de agentes culturais e equipes compostas de forma representativa por mulheres, pessoas negras, pessoas oriundas de povos indígenas, comunidades tradicionais, inclusive de terreiro e quilombolas, populações nômades e povos ciganos, pessoas do segmento LGBTQIA+, pessoas com deficiência e outros grupos minorizados.

Parágrafo único. Os mecanismos de que trata o inciso III do caput serão implementados por meio de cotas, critérios diferenciados de pontuação, editais específicos ou qualquer outra modalidade de ação afirmativa que garanta a participação e o protagonismo, observadas a realidade local, a organização social do grupo, quando aplicável, e a legislação.

Regras para prestação de contas

A prestação de contas levará em consideração categorias, conforme faixas de valores captados para o projeto, que serão definidas na Instrução Normativa.

A partir dessa inovação, haverá a possibilidade de procedimentos mais simples para prestação de contas nos projetos incentivados da Lei Rouanet, especialmente aqueles que vierem a ser considerados de pequeno porte.

Na prestação de contas, projetos incentivados de médio e grande porte deverão apresentar relatório de execução do objeto e relatório de execução financeira. Projetos de grande porte terão plano de monitoramento específico.

Decreto 11.453/23

Art. 51. (…)

I – nos projetos cujo montante dos valores captados seja de pequeno porte, a definição da categoria de prestação de informações aplicável ao caso concreto observará o disposto nos art. 29 a art. 34; (…)

II – nos projetos cujo montante dos valores captados seja de médio porte, o relatório de execução do objeto e o relatório de execução financeira serão exigidos em todos os casos, vedada a adoção da categoria de prestação de informações in loco; e

III – nos projetos cujo montante dos valores captados seja de grande porte, o relatório de execução do objeto e o relatório de execução financeira serão exigidos em todos os casos e haverá plano de monitoramento específico para a ação cultural.

Parágrafo único. Os procedimentos de que trata este artigo serão detalhados em ato do Ministro de Estado da Cultura, observado o disposto nos art. 29 a art. 34.

Planos anuais e plurianuais de atividades

Volta a ser prevista a possibilidade de planos plurianuais de atividades, que podem ser apresentados por entidades sem finalidade lucrativa, com duração de até 48 meses.

Os Planos Anuais e Plurianuais poderão ter qualquer objeto relativo a manutenção de instituição, espaço, grupo cultural ou corpos artísticos estáveis, ou eventos periódicos e continuados.

Além disso, o Ministério da Cultura poderá admitir a apresentação de Planos plurianuais de atividades para ações que considerar relevantes ou estruturantes para a cultura.

Planos plurianuais podem ser apresentados por qualquer entidade sem fins lucrativos que tenha natureza cultural.

Decreto 11.453/23

Art. 54. O fomento por meio do mecanismo de incentivo fiscal poderá contemplar planos anuais ou plurianuais de atividades apresentados por pessoa jurídica sem fins lucrativos, pelo período de doze, vinte e quatro, trinta e seis ou quarenta e oito meses, coincidentes com os anos fiscais, com vistas à:

I – manutenção:

a) de instituição cultural, incluídas suas atividades de caráter permanente e continuado e demais ações constantes do seu planejamento;

b) de espaços culturais, incluídos sua programação de atividades, ações de comunicação, aquisição de móveis, aquisição de equipamentos e soluções tecnológicas, serviços de reforma ou construção e serviços para garantia de acessibilidade, entre outras necessidades de funcionamento; ou

c) de corpos artísticos estáveis ou outros grupos culturais com execução contínua de atividades; ou

II – realização de eventos periódicos e continuados, como festivais, mostras, seminários, bienais, feiras e outros tipos de ação cultural realizada em edições recorrentes.

§ 1º O disposto no caput poderá ser aplicado para projetos apresentados por instituições que desenvolvam ações consideradas estruturantes ou relevantes para o desenvolvimento dos segmentos culturais, por recomendação da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, homologados pelo Ministro de Estado da Cultura.

§ 2º Poderão apresentar planos anuais ou plurianuais os seguintes proponentes:

I – associações civis de natureza cultural, sem fins lucrativos, cuja finalidade estatutária principal seja apoiar instituições federais, estaduais, distritais ou municipais no atendimento aos objetivos previstos no art. 3º da Lei nº 8.313, de 1991; e

II – outras pessoas jurídicas de natureza cultural, sem fins lucrativos.

Despesas com captação de recursos

Limitações para despesas com captação de recursos serão previstas na Instrução Normativa. A rubrica de captação não pode ser usada para pagamento de serviços prestados ao patrocinador.

Decreto 11.453/23

Art. 55. As despesas relativas aos serviços de captação dos recursos, no âmbito do mecanismo de incentivo fiscal, para a execução de programas, projetos e ações culturais aprovados no âmbito da Lei nº 8.313, de 1991, serão detalhadas em planilha de custos, observados os limites e os critérios estabelecidos em ato do Ministro de Estado da Cultura.

Parágrafo único. É vedado o uso de rubricas de captação de recursos para pagamento por serviços de consultoria, assessoria técnica ou avaliação de projetos prestados diretamente aos patrocinadores.

Divisão das contrapartidas entre patrocinadores

No caso de mais de um patrocinador, as contrapartidas serão divididas de forma proporcional ao valor aportado para o projeto, respeitado o limite total de 10% dos produtos do projeto

Decreto 11.453/23

Art. 61. Não constitui vantagem financeira ou material nos termos do disposto no § 1º do art. 23 da Lei nº 8.313, de 1991: (…)

§ 2º Na hipótese de haver mais de um patrocinador, cada um poderá receber produtos resultantes do projeto em quantidade proporcional ao investimento efetuado, observado o limite total de dez por cento para o conjunto de incentivadores.

Prazo de captação

O prazo de captação de recursos vai até o fim ano seguinte ao de aprovação do projeto. O projeto é prorrogado automaticamente por 24 meses, se não atingir a captação total nesse prazo

Decreto 11.453/23

Art. 64 (…) § 2º A captação dos recursos será realizada até o término do exercício fiscal subsequente àquele em que o projeto tiver sido aprovado.

§ 3º No caso de nenhuma captação ou de captação parcial dos recursos autorizados no prazo a que se refere o § 2º, os programas, os projetos e as ações culturais serão prorrogados automaticamente por mais vinte e quatro meses, exceto se houver pedido de arquivamento apresentado pelo proponente.

Conta do projeto

A transferência de doações e patrocínios poderá ser feita para conta aberta em instituição financeira credenciada junto ao Ministério da Cultura. Não é mais exigido que seja instituição financeira oficial

Decreto 11.453/23

Art. 65. As transferências financeiras dos incentivadores do mecanismo de incentivo fiscal para os agentes culturais serão efetuadas, direta e obrigatoriamente, em conta bancária específica, aberta em instituição financeira credenciada pelo Ministério da Cultura.

Art. 66. O controle do fluxo financeiro entre os incentivadores e os agentes culturais será feito por meio da captura automática de dados dos depósitos realizados pelo sistema eletrônico utilizado no âmbito do mecanismo de incentivo fiscal.

Decreto aplicável a cada projeto

Em regra, aplica-se o Decreto 10.755/21 para projetos aprovados na sua vigência.

Porém, o Proponente poderá pedir ao Ministério da Cultura a adequação do Projeto já aprovado, com captação de recursos, ao novo Decreto.

Já no caso de projetos sem captação de recursos, o Proponente poderá pedir a adequação ao novo Decreto, antes de iniciar a captação. Uma alternativa é solicitar o arquivamento do Projeto e apresentar uma nova proposta.

Decreto 11.453/23

Art. 78. As ações, os programas e os projetos culturais aprovados no mecanismo de incentivo fiscal com fundamento no disposto no Decreto nº 10.755, de 26 de julho de 2021, observarão as normas sob as quais foram aprovados e permanecerão válidos até o final de sua execução.

§ 1º No caso de projetos já em execução, com captação parcial ou total dos recursos aprovados, o proponente poderá apresentar solicitação de adequação ao disposto neste Decreto, o que será avaliado pelo Ministério da Cultura.

§ 2º No caso de projetos com execução não iniciada, com captação parcial ou total dos recursos aprovados, o proponente poderá apresentar solicitação de adequação ao disposto neste Decreto, o que será avaliado pelo Ministério da Cultura.

§ 3º No caso de projetos sem captação de recursos, o proponente poderá:

I – solicitar o arquivamento e a apresentação de nova proposta, similar e adequada ao disposto neste Decreto; ou

II – solicitar a adequação do projeto ao disposto neste Decreto antes de iniciar a captação dos recursos.

§ 4º Para fins do disposto no § 3º, a adequação será solicitada ao Ministério da Cultura, que emitirá parecer com observância ao disposto neste Decreto.

Prescrição

A prescrição da possibilidade de aplicação de penalidades será reconhecida de ofício (sem necessidade de pedido) pelo Ministério da Cultura.

Decreto 11.453/23

Art. 79. O Ministério da Cultura conhecerá de ofício os casos de prescrição do poder administrativo sancionatório, nos termos do disposto na Lei nº 9.873, de 23 de novembro de 1999.

Parágrafo único. A análise da ocorrência de prescrição para o exercício das pretensões punitivas e de ressarcimento precederá as análises de documentação de prestações de contas.

O prazo geral de prescrição, conforme a Lei 9.873/99, é de 5 anos contados da prática do ato, ressalvados os casos de interrupção e suspensão da contagem do prazo. No caso de processo administrativo paralisado por mais de 3 anos, há também a possibilidade de prescrição.

O STF já vinha reconhecendo a prescrição sobre prestações de contas de projetos culturais há algum tempo, sendo considerados imprescritíveis apenas casos mais graves, como o de improbidade. Saiba mais neste sobre o tema neste artigo.

Nova Instrução Normativa

A Instrução Normativa, com regras complementares para projetos incentivados, será editada em até 30 dias contados da publicação do Decreto 11.453/23. A nova IN poderá prever:

  • regras de transição
  • transferências de recursos para planos anuais e plurianuais
  • prorrogações de prazos de captação e execução de projetos com análise atrasada análise de planos anuais e plurianuais apresentados em 2022 em regime de urgência
  • apresentação ou desarquivamento de propostas de planos anuais e plurianuais para execução em 2023

Decreto 11.453/23

Art. 80. O Ministro de Estado da Cultura editará, em até trinta dias, as instruções normativas necessárias ao cumprimento do disposto neste Decreto, que poderão incluir:

I – regras de transição para os projetos em execução, de forma a garantir sua adequação ao disposto neste Decreto e sua regulamentação;

II – possibilidade de transferência de recursos captados em projetos por instituições sem fins lucrativos que optem por utilizar planos anuais ou plurianuais de atividades;

III – possibilidade de prorrogação de prazos de captação e execução de projetos em execução cuja análise de pendências administrativas esteja atrasada;

IV – análise, em regime de urgência, de planos anuais ou plurianuais de instituições culturais que tenham apresentado suas propostas em 2022 e ainda não tenham obtido sua aprovação para o exercício de 2023; e

V – possibilidade de apresentação ou desarquivamento de propostas de planos anuais ou plurianuais por instituições culturais, para início imediato no exercício de 2023.